A Starbucks está apostando alto na nostalgia.
A gigante do café revelou um plano de reestruturação de US$ 1 bilhão (R$ 5,3 bilhões) que fechará mais de 100 cafés na América do Norte, cortará 900 empregos não relacionados ao varejo e reformará mais de 1.000 locais.
A redefinição, disse o CEO Brian Niccol, visa restaurar o aconchego e o conforto — um esforço para recriar o “terceiro lugar”, que ele tem defendido desde que assumiu o comando no ano passado, o ponto de encontro entre casa e trabalho que fez da Starbucks uma marca global nos anos 90.
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Tentando recuperar a Geração Z
Ao mesmo tempo, a Starbucks parece estar perdendo terreno com a Geração Z, algo que admitiu tacitamente em seu último balanço, quando decidiu fechar as lojas “pickup” (somente para retirada) exclusivas para celular, construídas para velocidade e transações “sem atrito”, que presumia que seriam um chamariz para uma geração nativa digital.
Sua participação de mercado entre esse público caiu de 67% para 61% nos últimos dois anos, marcando quatro trimestres consecutivos de declínios, de acordo com a Consumer Edge.
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A Starbucks nega ter perdido força com a Geração Z: durante sua recente teleconferência de resultados trimestrais, Niccol observou que suas percepções de valor por parte do cliente estão em máximas de quase dois anos, impulsionadas por ganhos entre a Geração Z e os millennials, que “compõem metade de nossa base de clientes”.
No entanto, sem dúvida, como muitas redes de restaurantes, a Starbucks interpretou mal a geração. Ao ver sua timidez social e preferência por pedidos digitais, a empresa presumiu erroneamente que deveria estruturar suas lojas em torno desses comportamentos.
Mais calor e conexão humana
Mas Niccol disse aos analistas em julho que o formato exclusivo para celular era “excessivamente transacional e carecia do calor e da conexão humana que definem nossa marca”.
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A Geração Z, aposta Niccol, anseia por aquela velha sensação do Starbucks da mesma forma que anseia por um “verão da garotada dos anos 90”.
Apelidados por alguns como a geração mais solitária, eles estão gravitando em direção a cafés locais e peculiares que funcionam como centros comunitários e com significados culturais — o tipo que você veria em programas como Friends ou How I Met Your Mother, mostram os dados da Consumer Edge.
Niccol pensa que a resposta está na inovação original da Starbucks do “terceiro lugar”.
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Trazer de volta aquela sensação de Friends
A ideia do “terceiro lugar” vem do livro de 1989 do sociólogo urbano Ray Oldenburg, The Great Good Place (O Grande Lugar Bom), que argumentava que a sociedade precisa de locais de reunião além de casa e trabalho. Cafés, pubs, academias, salão de beleza — todos contam.
A Starbucks trabalhou duro para ser a epítome desse termo; seu CEO na época em que o livro de Oldenburg foi publicado pela primeira vez, Howard Schultz, usava-o com tanta frequência em talk shows de rádio e em entrevistas que as pessoas presumiam que ele o havia inventado.
“A Starbucks era notável por ter assentos espaçosos e confortáveis nos primeiros dias”, disse Karen Christensen, autora e colaboradora de Oldenburg, à The Pourover, newsletter sobre café.
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“Era o lugar habitual para encontrar um assento, wi-fi e eletricidade em uma cidade estranha, e um lugar comum para encontrar amigos.”
No entanto, essa vibração tem sido mais difícil de encontrar nos últimos anos. Drive-thrus e pedidos para viagens agora superam as longas permanências nas lojas.
Seis trimestres consecutivos de queda nas vendas na comparação com lojas já existentes, sugerem que os clientes não estão ficando por perto. Niccol disse em sua nota que o objetivo agora é trazer as pessoas de volta.
“Nosso objetivo é que cada cafeteria ofereça um espaço acolhedor e convidativo, com uma ótima atmosfera e um assento para cada ocasião”, disse ele aos funcionários.
A empresa diz que o novo investimento priorizará lojas que possam ser transformadas em “espaços de permanência”.
Espere mais canecas de cerâmica, assentos mais macios, tomadas e layouts projetados para fazer os clientes desacelerarem, em vez de apressá-los para fora da porta.
A Starbucks encerrou seu ano fiscal com cerca de 18.300 locais na América do Norte, mas o crescimento das lojas não será retomado até 2026.
O “terceiro lugar” de antes e o do futuro
O preço é alto: a Starbucks prevê gastar US$ 150 milhões (R$ 801 milhões) em custos de indenização e US$ 850 milhões (R$ 4,5 milhões) com fechamentos de lojas e reformas. O anúncio segue um investimento anterior de US$ 500 milhões (R$ 2,67 bilhões) em horas de baristas por meio de seu “Serviço Avental Verde” (Green Apron Service).
Mas as tensões trabalhistas pairam sobre a empresa. O sindicato Starbucks Workers United, que representa mais de 12 mil baristas, disse que exigirá negociação sobre os fechamentos. Líderes sindicais alertaram que os cortes correm o risco de minar a própria vibe comunitária que o Starbucks diz querer restaurar.
Além das finanças, o que está em jogo é cultural. Como Oldenburg argumentou, os terceiros lugares são vitais para a coesão social — espaços onde pessoas de todos os tipos podem conviver. Nos últimos anos, muitos terceiros lugares desapareceram, uma tendência acelerada pela pandemia.
“O espaço público de lazer é crítico para a sociedade”, disse a professora de Notre Dame, Gwendolyn Purifoye, ao The New York Times. “Se você não constrói lugares para se reunir, isso nos torna mais estranhos, e a estranheza cria ansiedade.”