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Francisco De Laurentiis, de Nova York (EUA)
12 de jul, 2025, 01:00
Quando o PSG montou um time de superstars em 2021, conseguindo reunir um ataque formado por Lionel Messi, Neymar e Kylian Mbappé, e ainda assim fracassou no sonho de conquistar a Uefa Champions League, uma pergunta ficou no ar: se nem o “trio maravilha” conseguiu a “Orelhuda”, quem seria capaz de realizar isso?
Após anos e anos de insucessos na busca de seu principal objetivo, o clube da capital francesa resolveu dar uma guinada em outra direção. Do Qatar, a alta cúpula que comanda o Paris deu a ordem: tragam o homem que é conhecido como o “mago do mercado”, o único que poderá preparar a “poção mágica” com os ingredientes certos.
Esse homem era o português Luís Campos, um senhor baixinho, já com o cabelo meio ralo e óculos de armação preta que pouco chamam a atenção. Se fosse em uma empresa “comum”, seria o “Seu Luís da Contabilidade”, aquele que analisa planilhas e gerencia custos durante o dia, antes de voltar para casa em seu carro sedan 1.0 (mais econômico, sabe como é…).
Apesar do jeitão discreto, muito longe dos dirigentes falastrões que amam dar entrevistas e estar o tempo todo na mídia, Campos entende muito dos bastidores da bola. Foi ele quem montou os times do Monaco e do Lille que ganharam a Ligue 1 em 2016/17 e 2020/21 – os únicos a impedirem conquistas do PSG na “era Qatar”.
Seu lema sempre foi “fazer o máximo com o mínimo possível”. Uma estratégia baseada no uso das categorias de base e em contratações mais low profile, de atletas que poderiam se encaixar nas ambições esportivas de cada clube, evitando ao máximo os “medalhões” que chegam custando fortunas e causando dores de cabeça diversas.
Ao chegar ao Parque dos Príncipes, o português encontrou um cenário muito diferente do que estava acostumado a trabalhar. De cara, ele ganhou um “cheque em branco” para contratar e recebeu liberdade total para comandar uma “revolução” em Paris, montando um elenco que fosse à sua feição: menos bling bling e mais vencedor.
Campos arregaçou as mangas e definiu a estratégia: primeiro, se livrar dos superstars; segundo, montar um PSG “mais francês”, com jogadores que entendessem melhor o que representa a instituição; e, terceiro, definir o treinador ideal para comandar seu projeto.
Três anos depois, o Paris Saint-Germain conquistou sua tão sonhada Champions League e agora tenta se tornar pela primeira vez campeão do mundo. A equipe vem destroçando todos que se colocam à sua frente, impondo placares assustadores contra gigantes como Inter de Milão e Real Madrid. Um time que parece impossível de parar.
O rival “final” para ganhar o Mundial de Clubes será o Chelsea, neste domingo (13), às 16h (de Brasília), no MetLife Stadium, com transmissão ao vivo pela CazéTV, disponível sem custo adicional no Disney+. Das tribunas, o “Seu Luís” estará assistindo ao esquadrão que montou buscar mais uma grande taça.
A revolução francesa
Logo após assumir as rédeas em Paris, em 2022/23, Luís Campos iniciou sua “revolução”. Os primeiros “medalhões”, como Di María, Ander Herrera, Paredes, Draxler e Icardi, deram adeus, enquanto nomes low profile, como os portugueses Vitinha, do Porto, Nuno Mendes, do Sporting, e Fabián Ruíz, do Napoli, chegaram.
Mas a verdadeira “faxina” ocorreu em 2023/24, quando deixaram o Parque dos Príncipes, em uma tacada só, superstars como Messi, Neymar, Sergio Ramos, além de outros jogadores de bom status, como Verratti, Wijnaldum e Bernat.
Por outro lado, Campos usou seu “cheque” em branco para torrar nada menos que 436,9 milhões de euros (R$ 2,833 bilhões, na cotação atual) em reforços, com destaque para o quarteto francês formado por Dembélé, Barcola, Kolo Muani e Lucas Hernández, entre muitos outros nomes. Foi a maior janela da “era Qatar” no PSG.
Quem também chegou foi o técnico Luis Enrique, que vinha em baixa após uma Copa do Mundo 2022 ruim com a seleção da Espanha.
A temporada seguinte (2024/25) começou de forma traumática, com a saída de Kylian Mbappé de graça para o Real Madrid após uma gigantesca e insuportável “novela” nos bastidores. Os resultados de início de temporada também foram claudicantes, e a imprensa francesa colocou Luis Enrique à beira da demissão em muitas ocasiões.
Nos bastidores, porém, Luís Campos segurou o treinador no cargo, ao mesmo tempo em que preparava seu “contragolpe” fatal.
Mais uma vez investindo alto, o cartola ajeitou a chegada de João Neves, Pacho, Doué e Kvaratskhelia, terminando de formar o elenco que conquistaria a “Tríplice Coroa”, chegando enfim ao sonho da Champions League, e agora alcançando a final do Mundial de Clubes.
Para se ter noção das mudanças que ocorreram em tão pouco tempo, os únicos remanescentes do vice da Liga dos Campeões 2019/20 são os zagueiros Marquinhos, que segue sendo titular absoluto, e Kimpembe, que se recupera de lesão.
Por outro lado, sete titulares do amasso por 5 a 0 sobre a Inter de Milão, na final da Champions 2024/25, foram contratados por Luís Campos, sendo cinco nas janelas de transferências mais recentes. Outros oito nomes recrutados pelo “mago do mercado” ainda estavam no banco de reservas.
Quanto às saídas, nada menos que 40 jogadores deixaram o Parque dos Príncipes, mudando praticamente todo o elenco em um espaço de apenas três temporada.
O custo de tudo isso? Meros 814,9 milhões de euros, ou R$ 5,3 bilhões…
Como dizem os franceses: Vive la révolution!
“Eu devo muito a ele”
O meia Bernardo Silva, do Manchester City, hoje é reconhecido como um dos melhores jogadores do mundo. Multicampeão por clubes e pela seleção portuguesa, ele já faturou praticamente tudo que é possível ganhar no futebol mundial e tem uma carreira de enorme respeito.
Mas nem sempre foi assim. Em 2014, ele ainda era um garoto recém-saído do Benfica e comprado a peso de ouro pelo Monaco, que tentava iniciar um projeto esportivo para dominar a França e a Europa.
No Principado, Bernardo foi “acolhido” por Luís Campos, que teve um papel de “mentor” em sua vida, como ele mesmo relata à ESPN.
“Diversos jogadores, como eu mesmo, devemos muito ao Luís. Ele nos encontrou em vários clubes, nos criou e nos mentorou”, afirmou o atleta dos Citizens.
“É incrível trabalhar com ele, porque ele possui uma gama enorme gama de habilidades sociais, além de um conhecimento sobre futebol que é incrível”, exaltou.
Outra pessoa que conhece bem todos os detalhes do trabalho de Campos, principalmente no PSG, é o repórter Adrien Chantegrelet, do jornal francês Le Parisien.
Enviado aos Estados Unidos para cobrir a trajetória do Paris no Mundial, o jornalista contou os bastidores de como o time francês escolheu o dirigente para comandar sua “revolução”.
“O desejo do PSG era contar um homem de experiência, com uma rede de contatos extensa e que conhecesse o futebol em todos os seus aspectos, não apenas a parte esportiva. Então, após a saída de Leonardo, a diretoria do Qatar escolheu Luís Campos. Uma revolução era necessária no Paris naquele momento, e a ideia era encontrar uma figura forte, que também pudesse se dar bem com o treinador daquele momento”, explicou.
“Esse era o caso com o Christophe Galtier, que conhecia Campos perfeitamente, e deu ainda mais certo com Luis Enrique, que trabalha de ‘mãos dadas’ com o português em quesitos como recrutamento, filosofia de grupo e estado mental dos jogadores”, salientou.
De acordo com Chantegrelet, a meta inicial da QSI também era que o cartola atuasse nos bastidores para tentar segurar Mbappé, que vinha sob constante assédio do Real Madrid.
“Com a chegada de Campos, também havia um desejo de provar ao Mbappé, que havia acabado de ampliar seu contrato, que o clube iria trazer uma pessoa competente. Afinal, Mbappé e Campos se conheciam há muito tempo, desde o Monaco. Foi uma mensagem forte que a diretoria enviou à sua principal estrela”, argumentou.
“A outra grande missão de campos era mudar a estratégia de contratações para algo menos focado em estrelas e mais na equipe, além de conseguir vender atletas que recebiam altos salários para recolocar as contas em ordem”, acrescentou.
Para o jornalista, as estrelas de fato se alinharam em Paris com a chegada do novo diretor esportivo, e o triunfo na Liga dos Campeões não foi mera obra do acaso.
“É óbvio que o fato do PSG ter vencido a Champions apenas três anos depois da chegada do Luís Campos não foi acaso. Ele teve um papel vital na tão sonhada vitória europeia. Claro que nem tudo foi perfeito, especialmente em sua primeira temporada, quando os atletas que ele trouxe não conseguiram desempenhar o que se esperava ou não conseguiram se integrar com a filosofia do PSG”, lembrou.
“Mas o recrutamento para a atual temporada foi um sucesso completo. Ele trouxe jogadores ‘desconhecidos’, ou que ainda buscavam afirmação, como Pacho, João Neves e Doué. Todos eles conseguiram se transformar em atletas de classe mundial em suas posições, mesmo ainda sendo jovens promessas”, continuou.
“Podemos citar ainda Vitinha, Barcola e Fabián Ruíz, que não eram considerados jogadores ‘estrelas’, mas se tornaram extremamente decisivos. Foi uma estratégia de recrutamento inteligente, feita em colaboração com o Luis Enrique, que aprova todas as contratações”, relatou.
Segundo o repórter do Le Parisien, aliás, essa é a principal diferença para o PSG do passado próximo.
“O que Campos fez foi realizar uma mudança grande em relação a anos anteriors, quando técnicos e diretores esportivos tinham visões totalmente diferentes no clube. Campos e Luis Enrique são ‘unha e carne'”, analisou.
“Além disso, o diretor foi decisivo para diminuir a massa salarial, liberando nomes como Neymar, Verratti e Messi. Em outros tempos, o PSG teria feito de tudo para manter esses ‘medalhões’, de forma a manter o status do projeto”, apontou.
Chantegrelet ainda detalhou como Luís Campos atua nos bastidores para controlar os egos em um clube e explicou por que ele é tão querido por jogadores que trabalharam com ele, como Bernardo Silva.
“Campos não abre mão de uma coisa: a disciplina. Desde que chegou ao Paris, ele colocou regras bastante rígidas, porque antes os jogadores estavam acostumados a fazer o que bem entendiam quando chegavam ao clube. Era claro que o PSG precisava de alguém para ser a autoridade no dia-a-dia, já que o presidente Nasser Al-Khelaifi não está sempre presente”, ressaltou.
“O Luís se enxerga como o ‘guardião’ desse projeto. E, neste ponto, ele também concorda com o Luis Enrique: o coletivo é sempre mais forte que o individual. Se um jogador quebra as regras ou não dá 100% de si, ele não tem espaço no projeto. Essa é a visão deles”, pontuou.
“Não à toa, Campos veio aos Estados Unidos para cultivar a harmonia coletiva que transformou o PSG em um time de sucesso e o levou ao título da Champions League. Ele quer oferecer a todos as melhores condições possíveis de trabalho, além de um grande equilíbrio entre atletas, estafe e comissão técnica”, afirmou.
Por fim, o jornalista prevê que a “era Luís Campos” será muito longa em Paris.
“Ele recentemente ampliou seu contrato até 2030 e vai seguir mantendo sua filosofia de trabalho duro, que é algo que ele não abre mão de ver nos jogadores. Campos entende que, sem trabalho duro, os resultados não chegam. E, nesse aspecto, ele sabe que pode sempre contar com Luis Enrique para manter a ‘pressão’ no elenco”, relatou.
“Depois do Mundial, há uma certeza: eles querem e farão de tudo para manter o alto nível de exigência que transformou o PSG no melhor time do mundo atualmente”, encerrou.
Os reforços de Luís Campos no PSG
2022/23
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Vitinha: 41,5 milhões de euros
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Nuno Mendes: 38 milhões de euros
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Fabián Ruiz: 21,5 milhões de euros
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Carlos Soler: 18 milhões de euros
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Nordi Mukiele: 10 milhões de euros
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Renato Sanches: 10 milhões de euros
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Hugo Ekitike: empréstimo com opção de compra
TOTAL: 139 milhões de euros (R$ 901,43 milhões)
2023/24
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Randal Kolo Muani: 80 milhões de euros
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Gonçalo Ramos: 65 milhões de euros
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Manuel Ugarte: 60 milhões de euros
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Ousmane Dembélé: 50,4 milhões de euros
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Bradley Barcola: 45 milhões de euros
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Lucas Hernández: 40 milhões de euros
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Hugo Ekitike: 28,5 milhões de euros
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Lee Kang-in: 22 milhões de euros
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Lucas Beraldo: 20 milhões de euros
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Gabriel Moscardo: 20 milhões de euros
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Xavi Simons: 6 milhões de euros
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Arnau Tenas: de graça
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Cher Ndour: de graça
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Marco Asensio: de graça
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Milan Skriniar: de graça
TOTAL: 436,9 milhões de euros (R$ 2,833 bilhões)
2024/25
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Khvicha Kvaratskhelia: 70 milhões de euros
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João Neves: 59,9 milhões de euros
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Désiré Doué: 50 milhões de euros
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Willian Pacho: 40 milhões de euros
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Matvey Safonov: 20 milhões de euros
TOTAL: 239,9 milhões de euros (R$ 1,554 bilhão)
Soma das três temporadas de Luís Campos
TOTAL: 814,9 milhões de euros (R$ 5,284 bilhões)
Onde assistir à final do Mundial de Clubes?
A final do Mundial de Clubes entre Chelsea e PSG, no domingo (13), às 16h (de Brasília), tem transmissão ao vivo pela CazéTV, disponível sem custo adicional no Disney+.