O mercado de crédito no Brasil vive um movimento inédito de compressão de prêmio de risco, sustentado principalmente pelo fluxo de investidores que direcionam recursos para essa classe de ativos. Essa dinâmica tem levado gestores a revisar estratégias e a manter maior cautela diante do risco de uma reversão súbita de cenário.
Rafael Gama, sócio da Grifo Asset, explicou que quase 70% da performance recente do crédito foi explicada exclusivamente pelo fluxo para a indústria.
“O grande trigger vai ser fluxo. Se ele mudar de direção, todo o movimento de compressão de prêmio de risco pode se inverter”
Segundo ele, essa endogeneidade cria um círculo vicioso: a queda dos spreads aumenta a rentabilidade, o que atrai mais investidores e, por consequência, pressiona ainda mais os spreads para baixo. “O carrego do crédito é muito bom, mas para que o fluxo migre para outros ativos será preciso um movimento de risk-on no Brasil”, destacou.
A avaliação foi feita no podcast Stock Pickers, apresentado por Lucas Collazo, em conversa com Gama e Luiz Eduardo Portella, sócio-fundador da Novus Capital.
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Crédito performa acima de outras classes de ativos
Na visão de Gama, a atual compressão do prêmio de risco encontra respaldo na comparação com outras classes. “Nunca tivemos um período tão longo em que todos os ativos de risco ficaram abaixo do CDI”, observou. Ele citou como exemplos o índice IMA-B5, que vive os piores três anos de sua série histórica, e a Bolsa brasileira, que está praticamente de lado desde 2021.
Essa performance fraca contrasta com o crédito, que tem mostrado consistência. Empresas aproveitaram o momento de liquidez para alongar dívidas e melhorar balanços, o que reduziu riscos de calote. “O crédito está indo muito bem, obrigado”, resumiu o gestor.
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Ainda assim, o sócio da Grifo Asset reforçou que a concentração de recursos nesse mercado exige prudência. A estratégia da casa tem sido manter mais caixa do que a média e evitar debêntures mais óbvias, aquelas que tendem a sofrer maior pressão de preço em caso de saída de fluxo.
“O mercado de crédito brasileiro ainda é disciplinante e relativamente pequeno diante do tamanho das gestoras. Esse descompasso pode gerar tropeços para quem não diversificar”
Estratégia de fundo menor dá flexibilidade
O desenho mais enxuto dos fundos da Grifo permite maior liberdade de gestão frente às grandes casas. Como explica Gama, a ausência de descasamento relevante entre ativo e passivo evita a necessidade de alocação compulsória em ativos menos atrativos.
“Estamos em um momento em que conseguimos comprar apenas o que gostamos muito. Não precisamos descer a régua para ativos que apenas toleramos”, disse. Essa abordagem preserva a qualidade da carteira em um ambiente onde spreads vêm caindo rapidamente.
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O gestor também destacou a vantagem regulatória de fundos mais jovens, que contam com prazos mais flexíveis para enquadramento. Isso possibilita manter maior percentual em caixa sem descumprir regras, o que se torna diferencial em cenários de abertura de spreads.
Segundo cálculos da Grifo, uma abertura de 100 pontos-base nos spreads de crédito teria impacto limitado de cerca de 2,17% no fundo da gestora. Já concorrentes mais alocados poderiam sofrer perdas próximas a 5%.
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Crédito segue atraente, mas exige seletividade
Apesar da compressão dos spreads, o crédito ainda oferece carrego elevado e isenção fiscal, fatores relevantes sobretudo para investidores pessoas físicas. “O benefício da isenção faz bastante diferença na conta final”, lembrou Gama.
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A gestora busca combinar esse atrativo com a expertise de Luiz Eduardo Portella em renda fixa, estratégia que, segundo eles, permite capturar ganhos em diferentes cenários.
“Nossa performance histórica mostra descorrelação com momentos de estresse, como no caso de Americanas e Light. Isso reforça a importância de manter caixa e flexibilidade”
Na avaliação dele, o futuro da classe dependerá do apetite dos investidores e do desempenho da economia brasileira. “O gatilho para saída de fluxo do crédito será um ambiente de risk-on no Brasil ou algum choque inesperado de crédito. Até lá, seguimos atentos às oportunidades”, concluiu.