Nem toda revolução começa com tecnologia de ponta; algumas nascem da saudade de uma infância vivida na rua, dos pés descalços no asfalto e da vontade de ver as crianças ocupando de novo os espaços com alegria e movimento. Foi assim que surgiu o projeto “Do pique ao pixel”, desenvolvido na Escola Municipal Nossa Senhora da Conceição, um dos trabalhos aprovados no programa Mais Ciência na Escola, promovido pela Secretaria Municipal de Educação, Ciência e Tecnologia (Seduct).
Idealizado pelo professor Sávio Martins Pereira, o projeto busca resgatar as brincadeiras populares e integrá-las ao cotidiano digital das novas gerações. Em vez de combater a presença das telas, a proposta é utilizá-las como aliadas. A iniciativa conecta cultura e inovação por meio de oficinas conduzidas por estudantes bolsistas, que recriam atividades tradicionais a partir de recursos tecnológicos simples e adaptados à realidade da escola.
Desde sua implementação, a participação dos alunos tem sido intensa e transformadora. Os estudantes atuam como protagonistas em todas as etapas: gravam vídeos, propõem adaptações, registram experiências e produzem materiais visuais. Cada ação é pensada de forma colaborativa, despertando senso de pertencimento e responsabilidade. “Eles não são apenas espectadores, eles criam, lideram, modificam. O projeto é deles”, explica o coordenador.
Com o envolvimento direto dos bolsistas, o ambiente escolar também passou por mudanças visíveis. Alunos tímidos passaram a se expressar com mais liberdade, o interesse por atividades extracurriculares aumentou, e o projeto se tornou uma referência dentro da escola.
Segundo Sávio, a gestão apoiou desde o início e os próprios colegas dos bolsistas passaram a desejar participar. “O exemplo contagia. Eles veem os amigos engajados e querem fazer parte disso”, relata.
A proposta também provocou uma mudança de percepção sobre a Educação Física, frequentemente vista como disciplina secundária. Ao mostrar que ela pode ser um campo de pesquisa, cultura, ciência e linguagem, o projeto ganhou o respeito de outros professores e da comunidade escolar. O reconhecimento foi unânime.
“Foi o único projeto aprovado na escola, e foi justamente o de Educação Física. Isso mostra o quanto nosso trabalho é potente”, destaca o professor.
Um dos diferenciais do “Do pique ao pixel” é a integração com o território da escola. As crianças entrevistaram familiares e vizinhos sobre as brincadeiras da infância, trazendo histórias que resgatam vínculos e fortalecem a memória coletiva. “Foi uma forma de dizer que a comunidade faz parte da escola e não foi esquecida. Construímos uma ponte entre o que fomos e o que ainda podemos ser”, afirma Sávio.
Participação ativa e tecnologia
O impacto vai além do pátio da escola. O projeto despertou nos alunos o desejo de aprender de forma mais significativa. Relatos de maior disciplina, curiosidade e envolvimento com os estudos têm se multiplicado. As atividades, por serem práticas, interativas e baseadas na experiência de cada um, geram motivação e engajamento. “Eles se dedicam mais ao projeto do que ao conteúdo tradicional da sala. Isso diz muito sobre o poder da vivência”, reforça o coordenador.
A iniciativa se alinha perfeitamente às diretrizes do programa Mais Ciência na Escola. Ao incentivar a investigação, o pensamento crítico e a produção de conhecimento com base na realidade dos estudantes, o projeto promove a iniciação científica de maneira acessível e contextualizada. “Estamos formando alunos que pensam, criam, questionam e transformam — exatamente como o programa propõe”, completa Sávio.
Outro ponto de destaque é o uso criativo da tecnologia. Em vez de uma abordagem técnica e distante, os recursos digitais são utilizados para registrar, comunicar e reinventar. Aplicativos simples, gravações com celular e ferramentas digitais acessíveis são meios para valorizar o que é local e coletivo. A tecnologia, nesse caso, é instrumento de inclusão e não de exclusão.
Ao unir tradição, inovação e protagonismo estudantil, o projeto transforma a escola em um espaço mais conectado com a vida dos alunos, valoriza a diversidade cultural e reforça a potência da Educação Física como campo do conhecimento. “Brincar é também uma forma de aprender. E a ciência está nisso: no corpo em movimento, no olhar curioso e no desejo de fazer diferente”, conclui o professor.