Ao completar 30 anos, o Plano Real segue sendo referência de transformação econômica no Brasil, mas a consolidação dos avanços ainda enfrenta desafios. Em entrevista ao podcast Outliers, Arminio Fraga avaliou que o país não conseguiu manter a perseverança necessária para sustentar a estratégia iniciada nos anos 1990.
O economista destacou episódios de instabilidade, mas também momentos de colaboração entre governo e mercado que ajudaram a estabilizar a economia. Fraga é sócio-fundador da Gávea Investimentos e ex-presidente do Banco Central.
“O Brasil teve essa guinada de estratégia com o Fernando Henrique, que foi preservada pelo Lula no primeiro mandato. Depois saiu da rota e voltou a repetir modelos que já tinham dado errado”, afirmou.
Ele lembrou que, em determinados períodos, quase 60% do crédito do país estava concentrado nos bancos públicos, comprometendo a eficiência da alocação de capital.
“Foi uma mistura de falta de perseverança, populismo, ‘curtoprazismo’ e patrimonialismo. O pêndulo pode até oscilar, mas não pode ser bola de demolição”
O economista também recordou os desafios enfrentados durante sua gestão no Banco Central, entre 1999 e 2002, período marcado por crises externas e a transição para o governo Lula.
“Foi um período muito estressante, mas com a colaboração da equipe econômica e depois do ministro Palocci, conseguimos reduzir o pânico e mostrar que o Brasil tinha condições de se estabilizar”, disse.
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A experiência no setor financeiro
Fraga relatou ainda a experiência de transitar entre o setor público e privado, destacando momentos estratégicos em sua trajetória na Gávea Investimentos.
Ele contou sobre a venda de sua participação para a JP Morgan em 2010 e a recompra em 2015, explicando que a decisão visava facilitar a sucessão e consolidar áreas de investimento.
“Foi uma parceria boa, funcionou conforme o combinado. Desenvolvemos algumas áreas para o JP, como bolsa, crédito e investimentos imobiliários. Lá pelas tantas, chegamos à conclusão que eu não queria ser presidente do conselho de um banco. Prefiro estar mais na linha de frente. Então recompramos a participação e fizemos algo justo para eles”, disse.
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O economista explicou que a Gávea manteve duas áreas principais após o retorno: multimercados e um fundo de participações focado em Growth Equity, com 60 investimentos ao longo de 15 anos.
“A decisão de parar foi dos mais velhos. Cada fundo que captávamos tinha 10 anos ou mais de responsabilidade, então só chega. Foi uma decisão não econômica”, afirmou.
O podcast Outliers é produzido pelo InfoMoney e conduzido por Clara Sodré, analista de fundos da XP, e Fabiano Cintra, head de Análise de Fundos da XP.
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Perspectivas pessoais e aprendizados de vida
Além de mercado e investimentos, Fraga compartilhou hábitos e aprendizados pessoais. Entre recomendações, destacou a importância do sono, alimentação, exercícios e convivência familiar saudável.
Ele também citou livros e podcasts que tem acompanhado, como Our Dollar, Your Problem, de Kenneth Rogoff, e The Righteous Mind, de Jonathan Haidt, além de meditação e leitura sobre estoicismo.
“Eu acredito muito em trabalhar em equipe. As coisas funcionam bem quando não são muito complicadas. Valorizo foco, credibilidade, honestidade intelectual e um comportamento sério. Instituições não aguentam pequenos desvios ou bobagens”, disse.
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Fraga acrescentou que padrões claros, competitividade saudável e disciplina são essenciais não apenas para produtividade, mas também para qualidade de vida.
Ele ainda comentou que continua próximo à gestão da Gávea, participando de comitês e decisões estratégicas, embora não esteja no dia a dia operacional.
“Participo, acompanho, mas estou bem satisfeito com essa vida. É fascinante e conecta muito com meu interesse em entender tendências políticas e geopolíticas”, afirmou.
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